Jorge Luis Gutierrez

 INUNDADA DE LUZ



A luz da manhã

roda e roda,

por arqueológicas

e longínquas estradas.


A luz insiste:

viaja e viaja


Ah! a pertinaz luz...


E eu me inundo de luz

e te trago à memória...

Revivo-te quando

tu também eras inundada de luz.


E me olhavas banhada de luz,

e me amavas molhada de luz.

E eu te amava tanto

envolvido

em tua feminina luz.


E a felicidade era

uma correnteza de luz.


E tinham beijos de luz

e vocábulos de luz.


Pensamentos luminosos

e amor cintilante...


Tudo era luz então...

pura luz… nada mais que luz...


Então eu te disse

que minha alma

era igual que os desertos.


E tu me disseste que tua alma

era como o céu azul da tarde...

azul... muito azul...

E sobre um mar também

profundamente azul.


E é isso o que agora

me faz pensar

nas inóspitas desolações,

e sentir a luz transitando

numa torrente de poesia:

caudalosamente azul

e impetuosamente calma...


E o deserto volta

sobre meus passos,

e me abre caminhos agrestes.


E é o deserto em sua extensão

que me chama e me chama...


E de repente penso

que quiçá fui eu

o que um dia morreu

nesse deserto...

que foi meu corpo

o que ficou imóvel

sobre a interminável aridez.


Mas é só ver teu rosto

e vejo que estou aqui,

tocando-te,

cheirando-te,

olhando-te...

E sei que não pude ter

sido eu o que tombou

nesse deserto.


E lembro tua mão

indicando-me o céu...

e dizendo-me

que assim era tua alma.


E dentro de mim

algo segue vagando

por essas solidões,

por essas afastadas sendas

opulentas de luz e vastidão...

que dormem imóveis

nas planícies do tempo...


E eu te amo ainda

como naquela luz...