Arnaldo Antunes

  eu tenho uma coleção de esquecimentos

e apenas duas mãos pra ver o mundo

meu dia passa inteiro num segundo

mas nada abafa a voz dos pensamentos


nem frontal e nem melatonina

eu tenho as saudades de um soldado

do que haveria de ser o meu passado

de tudo que escapou da minha sina


desculpas, culpas, lapsos de sinapses

impregnam minha corrente sanguínea

e sigo apassivando a carne ígnea

e aplainando os vértices dos ápices


eu sou o super-homem submisso

às rotas da rotina e ao tempo escasso

enquanto esqueço do próximo passo

anoto um outro novo compromisso


queria estar a sós comigo mesmo

e ter a eternidade toda em torno

desfalecer no fogo desse forno

até me desfazer como um torresmo