Tomás Antônio Gonzaga

 Eu, Marília, não sou nenhum vaqueiro,

Fui honrado pastor da tua aldeia;
Vestia finas lãs, e tinha sempre
A minha choça do preciso cheia.
Tiraram-me o casal e o manso gado,
Nem tenho, a que me encoste, um só cajado.

Já não cinjo de louro a minha testa;
Nem sonoras canções o Deus me inspira:
Ah! que nem me resta
Uma já quebrada,
Mal sonora lira!

Minha bela Marília, tudo passa;
A sorte deste mundo é mal segura;
Se vem depois dos males a ventura,
Vem depois dos prazeres a desgraça.

O ser herói, Marília, não consiste
Em queimar os impérios: move a guerra,
Espalha o sangue humano,
E despovoa a terra
Também o tirano.
Consiste o ser herói em viver justo:
E tanto pode ser herói o pobre,
Como o maior Augusto.



Do livro Marília de Dirceu

edição: José Aléssio