O filme Nós que nos amávamos tanto conta a história de três amigos, Antonio, Gianni e Nicola, que lutaram juntos na resistência italiana no fim da segunda guerra. A trama se desenvolve a partir dos reencontros e desencontros, dos caminhos seguidos por cada personagem.
Antonio, por causa das suas crenças políticas, sempre ocupa posições subalternas no hospital em que trabalha; Nicola nunca consegue se tornar um intelectual respeitado; Gianni não encontra caminhos para se tornar um advogado capaz de defender aquilo que acredita.
Enquanto Antonio e Nicola mantêm uma dignidade respeitosa consigo mesmos, sem renegar aquilo que acreditavam, Gianni opta por outro caminho, renunciando a seus projetos. Tudo aquilo que acreditava é abandonado, inclusive seu antigo laço de amizade com os dois. Ele deixa também seu grande amor, em suma abandona a si próprio. Esta renúncia acaba cobrando um preço alto demais.
Cada vez mais ressentido, Gianni se transforma numa figura trágica, isolado, completamente solitário.
Quase ao final do filme, quando os três finalmente se reencontram, há uma cena decisiva para compreender estas duas maneiras distintas de se relacionar com o passado. Enquanto Antonio e Nicola buscam celebrar aquele reencontro, rememorando o que passou, rindo do passado, Gianni sente vivamente seu desajuste, sua impossibilidade de rememorar qualquer coisa, simplesmente porque pra ele aquilo tudo nunca passou.
Do seu desejo amargurado nasce o sonho de refazer o passado: ele se imagina no campo de batalha, mas não da maneira como tudo aconteceu, e sim como se ele houvesse sido morto heroicamente na luta contra o inimigo. Essa cena sintetiza com muita força toda a tragédia que se abateu sobre Gianni.
Nós que nos amávamos… é repleto de referências, de citações, de homenagens aos grandes diretores italianos. Nicola, ainda no início do filme, fala que sua vida está profundamente entrelaçada com Ladrões de Bicicleta, filme que o obrigou a abandonar a província no sul da Itália e se mudar para Roma, quando reencontra Antonio.
Daí em diante, há sempre um diálogo sentimental com o cinema, que percorre os diversos personagens do filme. O melhor momento é, sem dúvida, a filmagem de A Doce Vida, quando
Antonio reencontra sua antiga paixão no meio dos ensaios para a elaboração da famosa cena da Fontana de Trevi.
Ao transformar a tradição em algo a ser reverenciado, mas não sacralizado, o diretor Ettore Scola
conseguiu produzir um filme belíssimo e profundamente tocante que, apesar de uma dose de melancolia, em nenhum momento descamba para a amargura.
Edição: José Claisson Aléssio