Paulo Bomfim

Eu sou aquele menino que o tempo foi devorando, na rotina dos sapatos. Mãos afagando lembranças, olhos fitos no horizonte à espera de outras manhãs. Aí paletós, aí gravatas, aí cansadas cerimônias, aí rituais de espera-morte! Quem me devolve o menino sem estes passos solenes, Sem pensamentos grisalhos, sem o sorriso cansado! ***** Passarei porque sou feito de filamentos do tempo. Sumirei dos corações, de lembranças, de registros, de improváveis certidões, Irei como quem chegou, ou melhor, nunca nasceu; Nem lembranças figuradas, obrigações de saudade ou graça que se transmite. Passarei por vosso mundo sem indícios de endereço, sem vestígios, no avesso de vossas almas! ***** ... Mas deixai-me poetar em nome dos que não sonham, dos que calçam desespero, dos fugitivos, dos vencidos, dos inocentes que esperam. - Que eu cante a vida que passa e os destinos sem destino, e meus versos sejam potros onde as crianças galopem. Sou feito de tudo e nada. ... Mas deixai-me poetar! edição: José Claisson Aléssio